Perder ou Perder-se: Luto e Melancolia em Freud
- Pâmela Queiroz
- 11 de mai. de 2024
- 2 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2024

Aceitar a perda: eis um desafio humano. Perder a si mesmo: eis um risco do luto não elaborado. Já nos tempos de Freud, com “Luto e Melancolia” (1917 [1915]), foram realizadas reflexões acerca de reações “normais” ou patológicas à vivência de perda. Em comum com o luto, a melancolia teria como características a perda de interesse pelo mundo exterior, o abatimento e a inatividade do sujeito acometido. Já como diferença primordial, o autor destaca o empobrecimento do Eu, a importante queda da autoestima. Isto é, para além do mundo externo abandonado, tornado desinteressante, na situação de perda o Eu melancólico também desmorona, perde-se, deixa de amar e de amar-se.
Enquanto no luto há um desinvestimento apenas temporário no mundo externo, com progressiva retomada das apostas libidinais em objetos outros, conforme a elaboração da perda, na melancolia o Eu termina por identificar-se com o objeto perdido (não necessariamente real), assume a posição de sua sombra e de certo modo paga com juros o preço da separação (FREUD, 1917 [1915]). É que ao não (conseguir) aceitar a perda do objeto, um pedaço de si, o Eu termina por jogar-se por inteiro fora. Perde tudo na tentativa de não perder nada.
Ademais, Freud coloca como particularidade da melancolia o caráter inconsciente do objeto perdido. E ainda que se saiba qual objeto foi perdido, não se sabe especificamente o quê nele foi perdido. Talvez resida aí a maior parte da dificuldade de elaboração da perda: como substituir algo desconhecido? Não que o trabalho de luto se faça de forma consciente e racional, porém possivelmente tratar-se de uma perda tão secreta ao próprio sujeito pode torná-lo ainda mais vulnerável ao desfecho em “autoperdição”, como quem afunda ancorado sob amarras invisíveis.
No fim das contas, a perda impõe-se ao ser humano como o imperativo da vida. A possibilidade de suportá-la (a perda, a vida) confrontará o sujeito sobre a questão de partir ou deixar partir-se, perder-se em partes ou no todo.
Pâmela Cristina Almeida Queiroz
Psicóloga │ CRP 17/6233
REFERÊNCIA
FREUD, Sigmund (1917 [1915]). Luto e Melancolia. In. FREUD, S. Obras completas, Vol. 12. Tradução Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
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